̶ O prazo é amanhã! ̶ gritou o chefe, um sujeitinho nervoso que
tinha por hábito berrar com os membros de sua equipe.
Lia
encarou-o por um segundo, levantou-se lentamente e, sobre o salto,
elevou-se cerca de vinte centímetros acima do chefe. Em um só
movimento, varreu a mesa com as mãos, lançando ao chão o
computador, pilhas de papel, caneteiro, porta retratos e tudo mais que
se acumulava ali.
̶ Foda-se ̶ foi sua única
resposta antes de apanhar a bolsa e sair ecoando por entre as mesas,
sob olhares perplexos dos colegas.
…
̶ O prazo é amanhã! ̶ gritou o chefe.
̶ Pois sente a sua bunda gorda
na cadeira e faça você mesmo ̶ respondeu Lia, sem desviar o
olhar da tela do computador.
O
homenzinho arregalou os olhos e, espiando nervosamente ao redor,
gaguejou:
̶ O... o... o que disse?
Ela
o encarou e sorriu; não o sorriso cálido e afável costumeiro dela,
mas um esgar de dentes, quase um rosnado.
̶ É o que você ouviu, seu
merda. Se quer a porra do trabalho feito até amanhã, sente-se e
faça ̶ disse, levantando-se e apontando a cadeira para o chefe.
Apanhou
a bolsa e saiu. Seus passos ecoavam entre os sussurros dos colegas.
…
̶ O prazo é amanhã! ̶ gritou o chefe.
Sem
responder, Lia levou a mão ao caneteiro e pôs-se a avaliar
cada caneta guardada ali.
̶ Você me ouviu, Lia? ̶ berrou num tom mais alto o homenzinho, vermelho de irritação.
Ela
o encarou, e algo em seus olhos o fez recuar dois passos. Não era o
olhar complacente tão próprio dela, mas um olhar furioso, cheio de
ira.
Num
gesto rápido ela se pôs de pé, agarrou o chefe numa gravata e cravou
repetidamente a caneta na carne flácida de sua papada. Sangue
jorrava da garganta e escorria da boca gorgolejante do homem, que lutava sem
sucesso, tentando se libertar.
Ela
ria o tempo todo. Ria quando quebrou uma das unhas cravadas no couro
cabeludo do chefe. Ria quando a caneta prendeu-se no pescoço do
homem. Ria enquanto apanhava a bolsa. Ria quando afastou-se da cena
de caos, em meio aos gritos dos colegas. Ela ria.
…
̶ O prazo é amanhã! ̶ gritou o chefe.
Lia
ajeitou-se na cadeira, encarando-o com seu olhar complacente. A resposta veio acompanhada do
velho sorriso afável:
̶ É claro.
O
nó na garganta cresceu, o aperto no peito aumentou. Todos os
demônios cochilavam naquela manhã, mas não ficariam assim para
sempre...
Gostaria de ter escrito
ResponderExcluir